Caríssimos,
Devo começar por referir que nunca almoçei no refeitório do Liceu. Mais, acho que nunca tive o privilégio de franquear as portas de tal lugar...
Saudades do liceu... algumas, não nego. Era novo, tinha cabelo, não tinha preocupações de maior e a Águeda Graça Brandão gostava de mim. Estava tudo bem comigo.
As recordações são muitas. Vou começar a alinhar as minhas memórias do liceu e, à medida que as vá arrumando, vou postando aqui no nosso cantinho.
Hoje evoco a memória de uma grande personagem do Liceu: o Sr. Ramalho. Os mais distraídos perguntam, com certeza: quem é o Sr. Ramalho? Explico. Era um "jovem" contínuo do nosso Liceu que tinha como posto de trabalho uma velha secretária no corredor do balneário dos homens, aquele que atravessa as referidas portas da cantina.
Segundo informações recolhidas junto da minha querida mãe, que também frequentou o nosso querido liceu, o Sr. Ramalho, na altura dela, já por lá andava a implicar com tudo e com todos. Ergo, no nosso tempo ele era já um dinossauro, um homem cheio de experiência pedagógica e de sensibilidade para lidar com os problemas dos alunos.
A fisionomia do Sr. Ramalho é um clássico da portugalidade: 1,60, gordinho, careca e um enólogo que, na equação quantidade/qualidade, optava, de forma inequívoca, pela primeira, sendo que a segunda lhe era uma verdadeira incógnita.
Homem de temperamento difícil, tinha como competências tomar contas dos famigerados livros de ponto, do depósito do material desportivo e, bem assim, acumulava funções de manutenção do balneário masculino. (Quanto ao balneário masculino o melhor é nem falar... Era, perdoem-me o plebeísmo, mas não encontro melhor palavra para o descrever, uma merda!). Se bem se reparar, o Sr. Ramalho tinha uma competência sem objecto, impossível, isto é: manter o balneário dos homens, local onde nada havia para manter...
Porquê escolher o Sr. Ramalho, perguntam os meus amigos. Sentimento de culpa. Ao longo de anos o senhor foi enxovalhado através de rimas que nem o próprio Bocage se lembraria. Do balneáreo masculino saíam rimas do género: "Ramalho cara de..." (a palavra em falta é uma asneira, começa por "c" e rima com alho, de Ramalho). O "Ganso", com a voz discreta que o caracterizava, soltava para o ar estas rimas, provocando a ira do Sr. Ramalho que nunca descobriu os autores do impropérios. O João Marco ria, eu ria, o Hélder achava que era um exagero...
O Ramalho morreu. Foi do coração. Desculpa Ramalho.
Fernando